Não poderia, de forma alguma, ficar indiferente à entrevista concedida pelo Sr. Eusébio Ferreira à Revista Única de 12 de Novembro último, e justifico o que acima afirmo em poucas linhas.
Eusébio iniciou-se a jogar futebol federado em 1958, nos Júniores do Sporting Clube de Lourenço Marques (SCLM), onde jogava a interior esquerdo e eu a guarda-redes. Nascidos ambos em 1942 - ele a 25 de janeiro e eu a 25 de março - pertencíamos ao mesmo escalão, por isso sei do que falo. Quando diz que, com 16/17 anos, já jogava nos séniores do SCLM, porque não existiam escalões inferiores, isso não é verdade! E relembro-o que o seu, e meu, primeiro jogo oficial foi contra o Benfica de Lourenço Marques, onde vencemos por 2-0, no escalão júnior. A foto seguinte - relativa à época 1958/59 da equipa de juniores do Sporting de Lourenço Marques, tinha ele 16 anos - desmente-o.
ESCALÃO DE JÚNIORES – ÉPOCA 1958/59 Braga Borges - André - Lino Alonso - Flores (Gomes) - Bessa - Cunha James - Manuel António - Ashok - Eusébio - Madala
Jogámos juntos a época seguinte, 1959/60, na qual também fomos campeões de Lourenço Marques pelo Sporting (ver segunda foto):
ESCALÃO DE JÚNIORES – ÉPOCA 1959/60 Braga Borges - Leitão - Bessa - Sau - James (capitão) - Coelho - Delfim Madala - Roberto Mata - Eduardo - Eusébio - Morais Alves - Isidro
Na época de 1960/61 é que ele sobe aos seniores, já então com 18 anos. E, ao contrário do que diz, o escalão júnior existia! E o tal jogo a que se referiu na entrevista à Única, em que marcou três golos ao Desportivo de Lourenço Marques, foi como sénior. Também não é verdade que tenha chorado quando marcou ao Desportivo. Tal como a restante equipa, festejou, isso sim! E, no jogo da final, marcou os dois golos com que o Sporting de Lourenço Marques derrotou o Ferroviário, cujo guarda-redes era Acúrcio Carrelo, ex FCP. Era um tempo em que não existiam rivalidades doentias, apenas as saudáveis rivalidades desportistas.
O que eu duvido que existam são os tais irmãos engenheiros. Como conheci relativamente bem a família dele, ele que diga onde se formaram os irmãos, uma vez que na altura Moçambique não tinha universidades. Eu acho graça aos "pobres de espírito" que - sem desprimor por ninguém - julgam que ser engenheiro é chegar ao topo do Mundo.
Diz também o Sr. Eusébio que o pai foi internacional por Moçambique. Como, se Moçambique era uma província - e não uma nação? Havia, isso sim, as seleções de Moçambique e a dos Naturais da Província. Ele que diga em qual delas jogou o pai. Em nenhuma - afirmo eu!
Para o fim, reservo a parte que para mim é mais importante, aquela em que afirma: "SPORTING, CLUBE ELITISTA E RACISTA"
Se éramos um clube elitista e racista, ele que explique então porque saíram do "seu" Desportivo, para jogar no Sporting, o Satar e o Merali, que eram indianos, e o Sérgio Albasini, que era mestiço. Menciono apenas estes, mas havia mais jogadores que saíram de livre vontade, pois, como bem sabem, não existiam transferências à base de dinheiro. E, já agora, que diga também quem saiu do Sporting para o Desportivo. Eu não me recordo de nenhum - e os jogadores nada recebiam, o Sr. Eusébio era a exceção!
Clube racista, diz ele... O Sr. Eusébio é que fala em racismo. Será que se recorda? Eu avivo-lhe a memória: a dupla de centrais era composta por Satar (indiano) e Rangel (misto/chinês); o avançado centro, Maurício, era preto (para não falar do próprio Eusébio); havia ainda Morais Alves, Roberto da Mata, Madala, etc. etc. etc., todos de raças diferentes.
E porque o clube não era só futebol e integrava outras modalidades desportivas, entre
as quais o basquetebol, relato aqui outro ponto que mostra bem o quanto éramos racistas. Reis Pires, basquetebolista preto, natural da Guiné e radicado na então Metrópole Portuguesa, quando cumpria o serviço militar foi transferido para Moçambique, onde recomeçou a jogar basquetebol, no Desportivo de Lourenço Marques. Mas ao fim de algum tempo quis ir jogar para o Sporting de Lourenço Marques, o tal clube que segundo o Sr. Eusébio era racista.
Racismo no SCLM? Mais uma vez o desminto. Então e quando o Sporting era convidado a participar em torneios na África do Sul (na época do apartheid) e uma das exigências para a participação era a equipa não incluir atletas pretos, o que é que os dirigentes do Sporting faziam? Não ia ninguém, declinava os convites! E, ao contrário de outros clubes, o Sporting é que era um clube racista, segundo o Sr. Eusébio...
Rivalidades? Na época, as rivalidades eram tantas ou tão poucas que, quando o Benfica foi campeão europeu, a direção do Sporting de Lourenço Marques disponibilizou veículos automóveis para que todos nós, do Sporting, pudéssemos ir para as ruas de Lourenço Marques festejar o acontecimento, o que fizemos com muita alegria e muito orgulho. É este Sporting, um clube respeitado, que engloba dirigentes, formadores, atletas e adeptos, que o Sr. Eusébio tenta denegrir? É bom que as pessoas saibam a realidade dos factos e que o conhecemos não de agora, mas de outros tempos...
A maioria dos atletas que defenderam, nas diversas modalidades, a camisola do Sporting de Lourenço Marques, felizmente ainda estão vivos e são as melhores testemunhas do que eu aqui afirmo. Muito mais haveria para dizer, mas fico-me pelo essencial.
Porque será que o Sr. Eusébio instiga ao rancor? Será para justificar o que o Benfica lhe paga? O amor à camisola não justifica tudo! E é feio "cuspir no prato onde se comeu"... Esta é uma outra forma de se ser Judas. O Sr. Camilo Antunes, o Sr. Elísio Pereira e o Vigorosa já devem ter dado muitas voltas no túmulo com tamanha ingratidão.
É que, para ser respeitado, tem de respeitar! Mostrou-nos uma faceta que lhe desconhecíamos e que, a meu ver, fragiliza a sua figura como Embaixador do futebol português. Eusébio Ferreira foi um excelente jogador, hoje confunde e diz inverdades. Não tinha necessidade! Sabes que eu tenho razão, Eusébio.".
E mais nada!
2011.12.02